quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

E a pergunta que não quer calar: afinal, o que afetaria eu tomar anestesia durante o parto?


“Olha, o esquema da anestesia é bem relativo. Ela pode ser ótima como pode ser uma merda, rsrsrs…
Existem casos em que sim, ela ajudou muito! E casos onde ela mais atrapalhou que ajudou.
O principal cuidado na anestesia é o anestesista! hahaha. Sério, tem que ser um cara bom, experiente em analgesia de parto, pra não te tirar os movimentos e a sensibilidade. Até porque o objetivo é analgesia ou seja, reduzir a dor e não tirar toda a sensibilidade. Pois a intenção e sentir, sentir o nascimento, não é? Ou você tomaria anestesia pra sua “primeira vez?”
A questão maior é a necessidade de anestesia. Sim, pode ser necessária. MAs na maior parte das vezes não é, até porque a dor tem sua função e existem milhares de formas naturais extremamente eficazes pra aliviar a dor. A dor produz endorfinas e as endorfinas produzem o prazer. ;) E a dor normal de um parto (sob condições naturais) é bem suportável. Na verdade, quando tu acha que não vai mais dar, está acabando a dilatação e a dor passa e vem os puxos. Os puxos não doem. São só vontade de fazer força. Aí vem o circulo de fogo, que é quando a cabeça chega no períneo. Nessa hora arde um pouco, assusta, tu pensa que vai te rasgar até a nuca. Mas aí a sensibilidade tambem é fundamental, porque sentindo o estiramento do perineo tu vai saber moldar a força pro bebê sair devagarinho, sem rasgar. E é nessa hora que ele nasce e é só alegria.

Qual a o momento que tu acha que mais dói? Como tu imagina essa dor? Temos que trabalhar isso. E tornar essa dor mais real e palpável pra ti. Porque não, não é a dor da morte, como muitas se referem. E nem a pior dor do mundo. Na verdade, é a melhor delas :D
Outra questão é da anestesia alterar a dinâmica do parto. Se tira tua capacidade de andar, já é meio caminho pra próxima intervenção. Se tu não sentir a contração, nem a hora de fazer força, lá vamos nós pra próxima intervenção. E Qual é?
A ocitocina sintética ou o sorinho. E por que é ruim? Porque aumenta a intensidade da contração, a duração e reduz o intervalo entre elas. Ok, você, anestesiada, não sente. Mas o que acontece com o bebê nessa hora?
A placenta armazena sangue oxigenado entre as contrações, porque na hora que o útero contrai, o fluxo de sangue teu para a placenta, reduz bruscamente. Então o bebê se mantem bem oxigenado por causa desse sanguinho que a placenta guardou pra ele. E claro, oxigena ainda mais entre as contrações, no intervalo delas.
E quando a contração é potencializada pela ocitocina sintética? Ela dura mais, ou seja: o sangue oxigenado que a placenta guardou pode acabar antes da contração. Ela é mais intensa portanto, a redução do fluxo sanguíneo é mais brusca. O intervalo é menor então, o tempo de reposição do sangue oxigenado é menor, podendo ser insuficiente. E assim se produz a maior desculpa atual para cesariana intraparto: o sofrimento fetal agudo, que nada mais é que a falta de oxigenação para o feto. Por isso que eu digo que a maior parte dos diagnósticos e sofrimento fetal são, na verdade, fabricados. O sorinho, dado indiscriminadamente para todas as mulheres em Trabalho de Parto, é o principal causador desse quadro.
A questão da perda de sensibilidade também é complicada. Muitas relatam que perderam a capacidade de fazer força, não sentiam os puxos e não conseguiam empurrar o bb pra fora. Aí vem pacotão Frank: Kristeller, episio, mais ocitocina, fórceps de alívio.
Kristeller é aquela manobra em que alguém sobe em cima da mulher e empurra a barriga dela pra baixo, empurrando o bebê pra fora. É ruim, claro, pois é bruto, aumenta demais a pressão sobre o períneo, aumenta as chances de lacerações significativas, o risco de problemas relacionados ao assoalho pélvico depois, sem falar que tem mulher que fica até com hematomas na barriga e há quem relate ruptura de baço, tamanha a brutalidade.
Episio é o cortezinho que, bem, com um médico comum, provavelmente vai ter, pq eles não conseguem resistir, cortam sim, toda mulher, sem nem perguntar. Mas mesmo que ele estivesse cogitando a hipotese de não fazer, nas circunstâncias descritas acima ele vai fazer porque bem, a “mãezinha” não está conseguindo fazer força, o bebê tem que sair daí logo, ela está anestesiada mesmo, aliás, onde está meu Fórceps?
Ai vem o forceps de alívio. Que não é aquela assombração de puxar criança pela cabeça com ferros. É um tipo de Fórceps que, usado corretamente  serve pra dar uma ajudinha, uma ajeitadinha final na cabeça do bebê. Aliás, toda cesariana tem o uso e fórceps pra ajudar o bb a sair pelo corte cada vez menor da barriga, mas isso ninguém conta. Mas é um Fórceps, é uma intervenção e como toda intervenção, traz seus riscos. aí a gente para e pensa que tudo poderia ter sido evitado se eu, lá no comecinho, não tivesse aceitado a tal da anestesia… :/
Era em tudo isso que eu pensava no meu primeiro parto quando a enfermeira perguntava se eu queria anestesia. E sem falar que a anestesia só deve ser dada depois dos 5 cm ou seja, meio caminho andado e eu vou por em risco tudo o que conquistei até agora?



E quando ela é necessária? Ué… tem casos em que a mulher já foi pro chuveiro, pra banheira, ganhou massagem, chá, aromaterapia, bola, enfim, tudo, mas a dor a paraliza. Sim. Tem casos em que o TP pára e o medo da dor vence. Em geral, uma dor absurda pode indicar uma posição anômala do bebê ou algum problema. MAs e se está tudo normal mas a coisa não flui, tu não consegue relaxar e trava? Acontece. Dr. Ricardo Herbert Jones, no livro memórias do Homem de Vidro, relata que presenciou, em todos esses anos, um caso em que isso de fato aconteceu, a mãe foi transferida pro hospital, tomou a anestesia e meia hora depois o bebê nasceu. Mas foi UM!!! Ou seja. É aquele momentinho, aquele segundo de superação que a gente pensa e se… mas ai a contração passa, vem um intervalo e tu pensa: quer saber, já tá acabando porque me disseram que seria assim, que quando eu achasse que não ia aguentar, ia acabar.
E vem outra contração, que dói um pouquinho mais, dura um pouquinho mais, e tu pensa: Quero anestesiaaaa! Mas procura uma posição se sente confortável, ela vai embora e tu pensa: venci mais uma!!! Que venha a próxima pq eu consigo!
E assim o TP avança, de uma em uma, como ondas em uma mar inicialmente calmo que vai ficando tempestuoso. Mas entre  cada turbilhão tu respira e se prepara pra próxima. E vai vencendo a luta pela sobrevivência, assim, passo a passo, como todas as tuas ancestrais fizeram.
E teu útero abraça e envolve teu bebê, massageando, estimulando e preparando esse novo ser pra nascer. Cada contração é um abraço, um abraço de despedida, um abraço de saudade, um abraço de amor. E a dor é a despedida, o rompimento, a partida. O fim da simbiose. O parto.
Voltando pra casinha: não falamos do bebê! Sim, a anestesia chega nele. Já foi demonstrado experimentalmente que bebês nascidos de partos medicalizados, com anestesia, tem reflexos imediatos pós nascimento prejudicados. Tenho um vídeo que trata especificamente do reflexo de sucção e demostra um bebê nascido de parto natural buscando ativamente o peito para mamar ao passo que, um, nascido de parto medicalizado, não procura. Fica ali, olhando pra teta e a teta pra ele, meio sem saber como agir (isso tb acontece com bebês que são afastados das mães após o nascimento, aconteceu comigo e com João, que foi levado pra banho e coisarada logo depois de nascer. Ele até chegou no peito, lambiscou, estava conhecendo, mas aí levaram ele. Quando voltou, não quis mamar. Foi um trabalhão fazer ele mamar depois, mas conseguimos. Claro que poderia ter sido diferente, como foi com Vini, um início de aleitamento espontâneo e natural). E isso pode sim prejudicar o início de uma amamentação bem sucedida (não que seja definitivo, mas pra que atrapalhar se a gente pode ajudar, né?).
Ah, por hora era isso. Tem mais coisa, com relação à anestesia, com relação ao sorinho e com relação à nossa relação com a dor. Tudo precisa ser trabalhado e desmistificado. Porque a gente teme o que não conhece. Quando passa a conhecer, vê que o monstro não tem sete cabeças.”
Eu não encontrei o vídeo que cito ali em cima, mas encontrei este aqui. Vejam como o bebê busca ativamente o peito. É lindo <3 . E é justamente isso que o bebê anestesiado (ou que é separado da mãe no pós parto imediato) não faz.
Nas primeiras horas após o parto o bebê nascido naturalmente estará ativo e alerta. É o momento ideal para iniciar a amamentação, para o imprinting (primeira olhada que o bebê dá no olho da mãe, pro rosto dela, gravando aquela imagem), para o estabelecimento dos vínculos. Se ele estiver com soninho, dopadinho da anestesia, pode ser que durma. O mesmo pode acontecer com a mãe, que pode ter os efeitos colaterais da anestesia ou até mesmo dormir e perder esse momento, tão breve e igualmente único e especial!
“Nenhuma outra função fisiológica do corpo é dolorida e o parto não pode ser uma exceção”
Dr. Grantly Dick-Read

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